Traição gera indenização por danos morais?
Traição no casamento e danos morais foram, por muito tempo, motivo de litígios perante o Judiciário. Antigamente, quando o adultério era considerado crime pela legislação brasileira, os efeitos jurídicos sobre a temática geraram muitas condenações em danos morais na justiça, visto que a lei considerava a situação grave e muitas vezes passível de reparação.
Com o passar dos anos, novos contornos sobre o assunto foram delineados pelos Tribunais, com a consequente descriminalização do adultério, o que gerou outros efeitos no mundo prático e jurídico. Questões sobre situações que podem gerar o dever de indenizar nesse sentido e o que a legislação atual entende sobre a temática serão abordadas ao longo desse artigo.
O que pode gerar o dever de indenizar?
A Emenda Constitucional 66/10 foi responsável por retirar do ordenamento jurídico o instituto judicial da separação, que fundamentou a base de muitos litígios sobre quem deveria levar a culpa pelo fim do casamento, trazendo mudanças significativas na prática. No âmbito penal, o adultério deixou de ser considerado crime e assim a sociedade foi sendo modificada culturalmente.
Na vigência de ambas as normas citadas, houve muitas indenizações a título de danos morais pela lógica da gravidade com que o Código Civil e o Código Penal tratavam da traição no casamento. Hoje em dia, os Tribunais entendem que o que gera direito à indenização é a eventual exposição vexatória da vítima, casos em que essa tenha sido humilhada e ridicularizada pela decorrência da infidelidade conjugal. Contudo, essa situação se enquadra no Art. 5º da Constituição Federal há muito tempo:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
…
V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
…
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
E nos Arts. 186, 187 e 927 do Código Civil:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
(…)
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
(…)
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
A leitura dos artigos faz com que entendamos a lógica do legislador ao longo dos anos. Portanto, pode-se concluir que a traição em si, não é ato ilícito que gera direito a danos morais, mas uma situação como outra qualquer que se composta por outros elementos capazes de expor a vítima à situação que lhe cause vergonha, vexame e humilhação, é passível de ressarcimento pela estrutura civil e constitucional, como qualquer outra com as mesmas características.
O que o Código Civil diz sobre as obrigações conjugais
O Código Civil preceitua como obrigações conjugais o seguinte:
Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
I – fidelidade recíproca;
II – vida em comum, no domicílio conjugal;
III – mútua assistência;
IV – sustento, guarda e educação dos filhos;
V – respeito e consideração mútuos.
Primeiramente temos que lembrar que o Código Civil é um código muito antigo e que nem sempre será possível acompanhar em texto as rápidas mudanças sociais que acontecem todos os dias. É inegável que a estrutura da legislação é monogâmica com fundo religioso, ainda que vivamos em um Estado laico e cada vez mais moderno.
Por mais que essas estruturas familiares venham mudando dia pós dia e que certas situações não tenham mais relevância jurídica, ressalta-se que a bigamia é considerada crime e segue sendo vedada pela legislação brasileira. Você deve estar se perguntando: se adultério não é mais crime, porque a legislação conserva o dever de fidelidade recíproca e todos os outros elencados no Art.1.566?
A resposta é simples. Como trazido nos tópicos acima, o Art. 187 sobre indenização preceitua que comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. A boa-fé e os bons costumes são considerados de acordo com cada caso, e as situações sempre serão analisadas pelo juiz com empatia e imparcialidade, partindo da realidade social daqueles que estão em litígio.
Podemos dizer que o Art. 1.566 é uma base a ser considerada de acordo com a realidade de cada cônjuge, não desabonando a sua existência ainda que os modelos familiares venham se modificando a cada dia que passa. O presente artigo tem cunho meramente informativo, sendo imprescindível a consulta a advogado tecnicamente habilitado para correta instrução e direcionamento conforme cada caso. Ficou com dúvidas? Entre em contato conosco! Será um prazer orientá-lo.